Fico a assistir à cena enquanto fumo o cigarro.
Nota-se a cumplicidade entre ambos, mas o que inicialmente pensava ser o verdadeiro pai do filho que a Joana carregava dentro de si, revelava-se agora uma mulher. Um pouco mais alta que ela, era a mais activa no diálogo. Joana ouvia-a cabisbaixa. Tinha que ver quem era.
Vou a sala, pego os óculos que uso só para conduzir e que invariavelmente ficam na mesa de apoio junto ao sofá, e volto para a varanda.
O vento sopra agora forte. O espanta espíritos dança e tilinta qual bailarina, olho o parque de estacionamento, sempre com os mesmo carros. Vazio. Onde foram? Debruço-me na varanda, olho para todos os lados, mas não está ninguém na rua. Um silêncio ensurdecedor enche a atmosfera da pequena praceta onde todos sem excepção estacionam após um longo dia de trabalho.
Viro as costas. Passo a mão pelo cabelo. Onde poderiam estar?
Sem me permitir qualquer reacção, algo me empurra contra o vidro da porta de acesso da sala à varanda. O silêncio ensurdecedor foi agora substituído por crucitar de centenas de corvos que me tentam agarrar e levar. Afasto-os furiosamente.
Deito-me no chão e rastejo para dentro da cozinha. Fecho a porta e vejo-os investirem furiosamente contra o vidro.
Levanto-me, examino-me ao pormenor, mas não estou ferido. Nem uma pena de corvo. Nem um arranhão.
De repente todas as luzes se apagam. Na cozinha, na casa, no prédio, na rua.
O silêncio de novo. Parado na minha frente, a pouco mais de dois metros de mim, um vulto. Altivo, gabardine, chapéu, olhos semi-cerrados vermelho brilhantes.
Engulo em seco. Estou em pânico mas a única reacção que tenho é,
- Quem está aí?
- Ahahahahahah já não te lembras de mim António?
- Quem és tu?
- É o último aviso. Deixa-a ir. O lugar dela não é aqui.
Nada daquilo me fazia sentido. Quem era aquele homem, o que me queria, que estava ali a fazer?
Aproximo-me dele e um cheiro forte que já tinha sentido a impregnar a sala, torna-se insuportável.
- Chega!! Estás avisado!
Todas as luzes se acendem! Ofuscado pela luminosidade repentina, levo a mão aos olhos. Quando me recomponho tudo está igual. O vulto desaparecera, o cheiro também, só o meu medo continua.
Vou de novo a casa de banho, acendendo todas as luzes no caminho.
Lavo a cara, o pescoço, os olhos, a boca. Fico a ver uma gota de sangue que me cai do nariz e resvala pela bacia deixando atrás de si um rasto macabro.
Vou para o quarto. Olho a meia luz a cama onde a Joana dorme profundamente.
Fico de pé parado, a olhá-la por um tempo que perdi a conta.
Não sei o que pensar, o que fazer. Teria sido tudo imaginação minha?
Sento-me na cama, abro a gaveta da mesa de cabeceira, tomo dois comprimidos que retiro de uma caixa semi desfeita.
Deito-me a seu lado, fecho os olhos, e deixo a fórmula química fazer o deu milagre.
O meu ultimo pensamento da noite vai para a Inês. Onde poderia ela estar?
15 comentários:
:D
BOM; BOM; BOM!!!
Epá uma pessoa fica numa ansiedade!!!
Beijos.
Chiça...isto vai-me parecendo com uma mistura de loucura, morte, dor, amor, desamor....sei lá mais.
Mas está excelente!
Quando é o próximo? heheheh
Beijinhos
Porque a melodia e a voz perfeitas inspiram o escritor.
Viciante, cativante... anseio pela continuação.
***
Parece-me que não vou querer ler mais...
Kiss :)
Menino, o sr vai sentar-se a escrever e não me dirige a palavra enquanto não acabar a história toda, todinha!!!
VÁ, TOCA A ESCREVER!!! NAO HÁ CÁ PAUSAS PRA IR À CASINHA XIXIZAR NEM HÁ CÁ BIRRAS QUE TÁ COM FOME!! FAXAVOR SÓ SAIR DO PC QUANDO A HISTÓRIA ESTIVER TERMINADA E PUBLICADA, SENÃOOOOOOO...GGGGRRRRRRRRRAU!!!
;-)
Acho que o Antonio vai vestir uma camisinha branca bem apertada e passar umas ferias longas :)
lol fartei-me de rir com o comentário da miepeee :)
Realmente.. realidade Vs Loucura!
a cena dos corvos surgirem.. o homem da gabardina.. a joana que está na rua e depois surge na cama do quarto...
Qualquer dia está o António no psiquiatra a dizer: "I see death people" lolada
eheheheh ;) que venha o próximo
Um bocadinho alucinante e aterrador...espero que o António ponha juízo naquela cabeça...
António, larga a droga!
Cá para mim, a Joana, nem está grávida...
Kiss
ah esqueci de uma coisa!
PArabéns poeta pelo belo reportório.. 5*
Amei as musicas do blog ;)
Só tenho um bocadinho para estar por aqui, e só li mesmo este capítulo e... isto está cada vez mais macabro xD
Giro, bem escrito (mas tens ali uns errozinhos no texto já agora ;P) mas quero saber o resto!
Beijocas poeta ;)
Muito bom !!
Fico á espera da continuação , a curiosidade é muita ....
Blue Butterfly
Isto está muito, mas mesmo muito marado... LOL
Os corvos são necrófagos.
O António está morto e não sabe?
Gostei da adaptação do traje do "Demo" aos tempos modernos - chapéu e gabardine para uma noite sem chuva... boa!
Reafirmo o comentário anterior.
Até ao proóximo capítulo!
Bjo.
???
Fiquei sem saber o que pensar com este capítulo...
Amor, quando eu acabar de ler tudo o que escreveste até agora, não me deixas ler os capítulos em primeira mão? ;)
A Flor é linda e merece :) LOL
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